segunda-feira, 23 de junho de 2014

Crise

  A paisagem girava, puxando os olhos e o pescoço da pequena Olivia. Pequena para viver tal trauma, mas grande no acúmulo deste. Enquanto o mundo girava insistentemente, completamente fora do controle da garota, a estrada parecia uma corrente que seguia na direção contrária à do seu destino.

- Já estamos chegando! - dissera a voz. Sempre estavam chegando. Mas a giratória do seu pescoço não se importava. Ou talvez se importasse sim, e por isso girasse com mais força para compensar a proximidade do seu fim.

  Olivia via cada detalhe do céu, mas sem apreciá-lo. Quem o apreciaria daquela forma?

  No hospital, ninguém a ajudava a segurar o pescoço tensionado.

- A ficha dela já foi feita? - perguntou uma voz seca. Era aquilo que importava, certo? Confirmar o direito ao auxílio, não o auxílio em si.

  O pescoço de Olivia doía como o inferno e, para piorar, o quarto tinha detalhes demais. Assim, seu olhar não conseguia se focar em um ponto e seguia virando para a esquerda.

  Esquerda. Esquerda. Esquerda.
  Vozes à esquerda. Mãos à esquerda. Cortinas à esquerda (e por todos os lados).

- É psicológico. O seu corpo não se mexe sozinho. - dissera novamente a voz seca.

  Olivia chorou. Era muito dor, e agora descrença. Dor e descrença. Descaso.

  Finalmente, comprimido.
  Antes tarde do que nunca, injeção.

  Esquerda. Meio. Esquerda.
  Pernas agitadas. Tremor. Frio.
  Morno. Meio.  Músculos relaxados.
  Olivia dormiu.

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