quinta-feira, 22 de julho de 2010

Mas Que Culpa Ela Tem?

O dia seria como qualquer um dos outros. Nada demais havia acontecido e a garota sentada em sua cama lia um livro calmamente. Lê-lo a fazia esquecer dos problemas, mandá-la para longe do que a incomodava. Tudo ficaria bem se corresse desse jeito, até a hora de ir dormir.

Mas não.

As pancadas na porta foram o primeiro sinal. Ouviu um grito feminino exaltado. Ouviu a voz dele. Mais uma vez, fora de si. Mais uma vez, alimentando o ódio dentro da garota. Ouviu o homem xingar a mulher, ouviu a mulher retrucar. Continuou imóvel na cama. O livro aberto na mesma página, o dedo marcando a linha onde parara. Tudo ficaria bem se acabasse ali. Era normal aquilo acontecer, apesar de desgastante. Tudo bem se parasse ali.

Mas não.

Os xingamentos continuaram. Ele começara a usar aqueles argumentos que a garota tanto detestava. O rosto dela continuava sem expressão. Ouviu o homem citar seu nome. Ouviu todas as ofensas direcionadas a ela. Não se sentia ofendida, mas ele não tinha o direito. O ódio continuava a crescer, crescer, crescer. Conseguia quase vê-lo: uma fumaça preta que embaçava sua visão - e a sua mente. Tudo bem se ele fosse dormir e parasse apenas nos xingamentos.

Mas não.

Ouviu a mulher caminhar até ele. Ouviu ela mandá-lo ir para a cama. Ouviu ele chamá-la daqueles nomes horrível. Não ouviu-a retrucar. Ouviu um tapa. Opa, aquilo não era normal. Ele havia batido na mulher? A garota tirou os olhos do livro e levantou-se. A mulher devolveu o tapa. Então, ouviu um murro. E a fumaça preta embaçou completamente sua mente. Em passos rápidos, pegou a faca na cozinha. Em passos ainda mais rápidos, chegou à sala e olhou para aquele homem asqueroso. Nas condições em que ele estava, bastou um empurrão e ele caiu. A garota, de olhos vendados pelo ódio, esfaqueou-o. E, após fazê-lo e observar o homem sem sinais de vida, mudou finalmente a expressão. Sorriu.

Aquele podia ser mais um dia qualquer: com um cheiro de bebida, com um estresse de costume, com palavras ofensivas já previsíveis. Mas não. Naquele dia, a garota matou o próprio pai.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Anos 20

Paródia da música A Malandrinha, escrita por Freire Júnior em 1927. A paródia foi escrita por mim para a gincana do meu colégio que, por sinal, escolheu péssimos jurados, haha.


Mulher, jovem mulher
Com seus cabelos a la garçonné
Vai ao salão de jazz com cloché
Pr'os conservadores fácil ela é

Mulher, que o espartilho arrancou
Mostraste as pernas em público
Passaste a beber e fumar de súbito
Teu tempo de glória chegou

Anos vinte, és apenas um começo
O mais certo dos tropeços
Desviaste o caminho à revolução
Enviaste à mulher a satisfação
Ensinou-a a gritar: Não obedeço!

Arte moderna, substituiste a vanguarda
"Novo" é como o povo te chama
Ganhaste até tua própria semana
Da história, estais sobre resguarda

Arte, não te deram o devido valor
Mas tuas poesias são declamadas
Tua música é orquestrada
Para teus artistas, que dissabor!

Anos vinte, és apenas um começo
O mais certo dos tropeços
Levaste a arte ao reconhecimento
Apesar do retardo do acontecimento
A modernidade espalhando-se ao vento

Anos vinte, foste apenas o começo
O mais certo dos tropeços
Desviaste o caminho à revolução
O moderno não tem explicação
Arte e mulher, profunda gratidão.