quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Distração

Conversas. Ruído. Movimento. Atenção.

Trava.

Estou em um corredor. São várias as portas, são tantas as curvas, as inúmeras bifurcações. Quero abrir todas as portas não abertas, é tanto para ver. Mas olho pra trás e vejo as que já abri.

Vergonha, Embaraço. Raiva. Medo. Dor.

Tento voltar a olhar para o caminho à minha frente, mas as portas abertas me sussurram tudo que não quero ouvir. E, de olhos fechados, saio abrindo portas aleatórias, apenas para calar as do passado, e cometo novos erros. "O que eu estou fazendo com a minha vida?"

É com esse pensamento que a trava se desfaz. Balanço a cabeça. Estou de volta ao mundo real.

Procuro conversas, ruído, movimento, atenção. Preste atenção. Não quero voltar à minha própria mente.


segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Jogo da Vida

Era uma vez cinco meninas. Eu, você, ela, aquela e outra.
Elas tinham de atravessar um caminho esburacado da floresta até um ponto de chegada.
Você caiu duas vezes no caminho, machucando um pouco as mãos e bastante um joelho, sendo a segunda a chegar.
Ela caiu seis vezes, se arranhando toda, mas só superficialmente, chegando em terceiro.
Aquela não caiu nenhuma vez, mas perdeu o fôlego e foi a última a chegar.
Outra bateu a cabeça num galho e desmaiou, mas acordou pouco depois e conseguiu chegar em quarto.
Eu caí inúmeras vezes, fiquei presa em arbustos, fui atacada por abelhas, me perdi, pisei em uma farpa e torci o pé, mas cheguei em primeiro.
Quando as outras garotas chegaram e me viram, chorando de dor completamente só, me deram os parabéns. Eu continuei a chorar.

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Pequenas Coisas

Eu gosto do silêncio
da manhã
e de uma ampola de
diazepam

Eu gosto de me
sentir sã
e de um pouco de
alprazolam

Eu gosto de
jogar serpentina
e da minha dose diária de
paroxetina

Eu gosto de ser
gentil
E de enormes quantidades de
rivotril.

Medo

Eu sempre gostei de uma boa dose de adrenalina. Montanhas-russas, os filmes de terror mais bizarros, surpresas, desafios, psicotrópicos, aventuras, um coração partido.
Tudo isso dá um gosto artificial de ansiedade, sem um perigo real à vista.

Hoje, tudo isso ainda me atrai. Mas me dá taquicardia. Hiperventilação. Angústia. Ataque de pânico.
Eu não consigo mais fazer o que um dia amei. Porque tenho medo. Porque agora existe um perigo real. E eu não sei enfrentá-lo.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Suspiro

Não entendo por que as pessoas querem ser profundas.
Ser profunda é uma grandiosa merda.
Eu queria ser superficial. Eu queria vivenciar uma coisa e pôr um ponto final depois dela. Mas não. Eu cavo. E cavo. E cavo. E, quando percebo, estou em um buraco tão fundo que a superfície é só um ponto distante de luz. E eu não mais consigo voltar a ela.

Inverno

Nem sei mais o que quero
Se te esqueço ou se te espero
Não sei se fujo ou corro atrás
Se é pra sempre ou nunca mais

Você vem de vez em quando
A minha vida vai adentrando
E parte sem esclarecer
O que fui e sou pra você

Vai, vem, vai, fica aí
Será que é melhor desistir?
Vale ainda a pena insistir?
Nem tudo que gosto me faz feliz

Nem sei mais o que sou
Se um clichê ou um sonhador
Não sei se surto ou sigo o fluxo
Se é passageiro ou ininterrupto

Mas à minha mente vem seu rosto
Tento lembrar do seu gosto
Sem saber se vai voltar
Ou se vou me aventurar

Vai, vem, vai, fica aí
Será que é melhor desistir?
No que mesmo devo insistir?
Nem tudo que gosto me faz feliz

Múltipla

Em mim vivem várias pessoas.
Algumas eu não gosto, outras me envergonham, e ainda há aquelas que me machucam.
Mas também existem aquelas que me fazem companhia, aquelas que dizem coisas bonitas e inteligentes, e aquelas que me surpreendem.
E eu adoro uma boa surpresa.

Ativismo

Mas como é bobo o ser humano. Quer mudar o mundo, alterar completamente o emaranhado de problemas que é a sociedade.
Mas não consegue nem mesmo mudar a si mesmo.
Não dá valor aos pequenos gestos.
Do que adianta lutar por causas políticas se partes um coração sem o menor remorso?

Vazio

Em meu anseio
Desejo desesperado
Minhas mãos tentam alcançar
Um rosto que não posso ver.

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Sábado à Noite

Coloquei um vestido que gosto
O sapato que me deixa menos insegura
Meu batom favorito
E só consigo pensar
Em ir pra casa

A solidão está em todos os cantos
Sozinha de fato ou rodeada de outros
Não importa
Ela está sempre ao meu lado
Sem fazer som algum

E em momentos de sobriedade
Eu crio coragem, olho pra mim
E pergunto a mim mesma
Quando foi que eu deixei
De ser feliz.

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Sob as Árvores

Eu me perco de propósito
Só pra ver se você me acha
Mas minha mente é lugar inóspito
E falsa esperança não tem graça

segunda-feira, 7 de julho de 2014

Fim

Eu luto contra essa vontade há um bom tempo. Às vezes ela vem mais forte, me sussura no ouvido e quase me faz ceder. Às vezes é só uma sugestão que passeia pela minha mente. Mas ela está presente, e eu tenho medo dela.
Problema vai ser quando ela vier e eu não tiver medo algum.

Desejo

Eu não quero sexo casual
Nem alguém pra me beijar na balada
Se eu vou dormir sozinha

Eu quero um beijo na pálpebra
Eu quero andar de mãos dadas
Eu quero dormir de conchinha

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Crise

  A paisagem girava, puxando os olhos e o pescoço da pequena Olivia. Pequena para viver tal trauma, mas grande no acúmulo deste. Enquanto o mundo girava insistentemente, completamente fora do controle da garota, a estrada parecia uma corrente que seguia na direção contrária à do seu destino.

- Já estamos chegando! - dissera a voz. Sempre estavam chegando. Mas a giratória do seu pescoço não se importava. Ou talvez se importasse sim, e por isso girasse com mais força para compensar a proximidade do seu fim.

  Olivia via cada detalhe do céu, mas sem apreciá-lo. Quem o apreciaria daquela forma?

  No hospital, ninguém a ajudava a segurar o pescoço tensionado.

- A ficha dela já foi feita? - perguntou uma voz seca. Era aquilo que importava, certo? Confirmar o direito ao auxílio, não o auxílio em si.

  O pescoço de Olivia doía como o inferno e, para piorar, o quarto tinha detalhes demais. Assim, seu olhar não conseguia se focar em um ponto e seguia virando para a esquerda.

  Esquerda. Esquerda. Esquerda.
  Vozes à esquerda. Mãos à esquerda. Cortinas à esquerda (e por todos os lados).

- É psicológico. O seu corpo não se mexe sozinho. - dissera novamente a voz seca.

  Olivia chorou. Era muito dor, e agora descrença. Dor e descrença. Descaso.

  Finalmente, comprimido.
  Antes tarde do que nunca, injeção.

  Esquerda. Meio. Esquerda.
  Pernas agitadas. Tremor. Frio.
  Morno. Meio.  Músculos relaxados.
  Olivia dormiu.

terça-feira, 8 de abril de 2014

Carta Anônima

Olá,

  Acho que já te contei que passei por uma depressão. Foi a pior fase da minha vida e me afetou brutalmente. Mas não é sobre isso que quero falar. O caso é que, algum tempo depois que melhorei, me vi impossibilitada de chorar - algo absurdo para o tipo de pessoa que chora vendo desenho animado e comédias românticas. Veja bem, eu ainda me sentia triste, com um nó na garganta, mas as lágrimas não vinham. Não havia drama que molhasse minhas pálpebras. Nem mesmo raiva. Comecei a me preocupar de verdade.

  Bom, eu estava chorando agora a pouco. Também chorei dois dias atrás. E me sinto disposta a chorar mais um bocado.

  Enfim, muito obrigada.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Ansiedade

Hoje eu acordei
Pensando em você
Que não larga mais de mim
Não sei nem dizer por que

Tomei um, dois, três
Comprimidos só pra ver
Se você desiste enfim
Já to pra enlouquecer

Eu dei entrada na urgência
O médico tava sem paciência
Meu bem, me deixa respirar
Larga o meu pescoço que não para de entortar

Eu to parecendo doida, meu amor
Olhando os lados morrendo de pavor
Com medo que você apareça
Eu to cansada de ser doente da cabeça

Todo mundo acha descolado
Ter um monte de transtorno, tomar remédio controlado
Mas, querido, eu não aguento mais
Então sai da minha frente, eu só to querendo paz.

quarta-feira, 19 de março de 2014

Autorretrato

Poucas coisas na vida
causam tanto estrago
quanto experimentar
o que não se pode ter.

Poucas coisas na vida
dilaceram tanto um peito
quanto uma decepção
que encontramos ao acaso.

Poucas coisas na vida
são tão cruéis quanto
dar falsas esperanças
a um doente.

A vida é feita de muitas coisas certamente.
Mas nenhuma machuca tanto
quanto não conseguir ser feliz.

quinta-feira, 6 de março de 2014

Dependência

Minha cabeça só funciona
quando meu peito dói.
Deve ser por isso que eu destruo
cada setor da minha vida
com tamanha meticulosidade.
Para me manter pensante,
eu preciso da dor.
Mas preferia não pensar em nada.